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Банкир-анархист и другие рассказы / O banqueiro anarquista e outros contos - Фернандо Пессоа

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— Concorda, não é verdade, em que a verdadeira Igreja é a que for a verdadeira Igreja?

E o outro respondeu: «É claro que concordo».

— Se estamos, pois, de acordo — disse o católico —, vamos jantar juntos.

Assim fizeram, e como o católico não ficou ofendido e doesse ao cristão a possibilidade de o haver ofendido, foi o católico que comeu com vontade e o cristáo quem, por sua vontade, pagou a conta.

Moralidade:

Esta pergunta, mas da qual — a resposta de Lope de Vega, que se está em 1900.

O papagaio

Havia em um dos arrabaldes de Lisboa um homem chamado Silva. Este Silva casou, já pouco jovem, com uma viúva que tinha uma filha quase mulher. A mulher do Silva passou logo a dominá-lo; e a enteada, à medida que crescia, mais e mais ajudava a mãe no dominio do padrasto.

O Silva passou a ser um trapo humano. Deixou de ter personalidade, vontade e lugar. Em tudo na vida doméstica como na prática, era um servo da vontade da mulher, quando o não era da vontade, por vezes até espontânea, da filha déla.

Como o domínio gera o desprezo, e o desprezo permite tudo, a mulher do Silva, apesar de não ser de espírito leviano, foi levada, pelas circunstáncias, a trair o marido. O amante, que era um indivíduo que fora promovido a primo déla para efeitos decorativos, foi elevado a quase residente na casa, e o Silva que não podia ignorar a sua categoria sexual, tinha que o receber, que lhe sorrir bem e que lhe exprimir, por palavras e modos, o prazer que lhe dava a sua excessiva visita. E assim fazia o Silva.

Mais tarde, conseguiu a mulher do Silva que o amante fosse nomeado por este gerente e mandatário das suas propriedades, dele Silva. E assim seguia e se consumava o domínio do marido, mero animal pagante naquela engrenagem de domesticação.

Ora o Silva tinha um papagaio — ave já velha e nem por isso muito esperta: gritava mais do que falava, e, quando falava, era sempre a mesma coisa. Um dia a mulher do Silva, maçada, muito naturalmente, com o vozear do pássaro, ergueu-lhe o poleiro da escápula sobre o quintal e vendeu-o a um viandante qualquer.

Quando o Silva voltou, à noite, para casa, e lhe faltou, de aí a minutos, a voz rouca da ave, procurou-a na escápula da parede sobre o quintal, não a viu, e foi à casa de jantar perguntar à mulher por ele.

«Vendi-o» disse ela, e enteada ria. O Silva retirou-se como de costume, sem dizer nada.

Foi, porém, ao quarto de cama, tirou o revólver da gaveta da mesa de cabeceira, voltou à casa de jantar e, com dois tiros calmos, certos e sucessivos, matou a mulher e a enteada.

Moralidade:

Nações imperiais e dominadoras, expansivas, cuidado sempre com o papagaio!

A varina e a lógica

Quando as quatro varinas corriam em losango pela rúa e ao lado, a do avanço, loura e com olhos, deu com o instinto de troça contra o homem moço de barbas de velho que vinha tendo ar de sábio pelo passeio às avessas. E parou, e, instintivamente, os transeuntes pararam. E ela largou a mão de alto, de sobre a canastra, apontou para o homem e disse:

— Olhem para este barbaças.

Toda a paisagem humana riu junta.

O homem mogo de barbas velhas parou à beira do passeio como de um cais, olhou abstracamente a varina, e disse num tom triste:

— Bem se vê que foi tua avó que te pariu!

A varina estacou mais, corou, emudeceu com uns poucos de silêncios, e em torno rebentou, depois de um pouco, uma gargalhada do público já trespassado. Não se distinguía se a gargalhada era da resposta, se da confúsáo muda da varina loura.

O homem moço passou, levou as barbas de velho escondidas pelas costas viradas ao público que o aplaudira. Depois, num café, contou o episódio a um amigo. O amigo ouviu, riu, e depois não pôde rir. Por fim fez um gesto em que a face era envergonhada a medo.

— Você desculpe. Eu serei talvez estúpido, ou estarei estúpido hoje. Mas o que quer isso dizer?

— Não quer dizer nada, respondeu o outro. E aí é que está o golpe.

Moral:

Confundir é vencer.

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